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Grupos Temáticos

11/10/2016 - 13:30 - 15:00
GT 1 - Dilemas e Desafios de Pesquisas Etnográficas

10734 - DILEMAS METODOLÓGICOS DA ETNOGRAFIA DO USO DO CRACK E DO PROGRAMA DE BRAÇOS ABERTOS DA PREFEITURA PAULISTANA
YGOR DIEGO DELGADO ALVES - UNIFESP, PEDRO PAULO GOMES PEREIRA - UNIFESP, ODILON CASTRO - UNIFESP


Apresentação/Introdução
Diferente da cocaína em pó que pode ser inalada ou injetada, o crack em pedra é fumado, o que o assemelha quanto à rapidez de início dos efeitos e sua magnitude ao uso da cocaína por via intravenosa. Outras implicações do uso do crack dizem respeito à dinâmica social de uso. Trata-se de uma droga que, sob certas circunstâncias, revela-se empatogênica, o que faz surgir, aliado a outros fatores como sua disponibilidade e vulnerabilidade da população em situação de rua, as cenas de uso conhecidas como cracolândias, um importante problema de saúde pública.
Muitas teorias enfatizam as poderosas propriedades farmacológicas dos psicoativos, outras, destacam estruturas de personalidade deficientes. É também comum associar o uso de drogas a deficiências de desenvolvimento social, como pobreza. Porém, não se deve colocar ênfase em um dos aspectos do uso de qualquer droga, seja ele farmacológico, psicológico ou o social. Enquanto a maior parte das teorias sobre o uso de substâncias é baseada em experiências advindas da clínica de usuários problemáticos, portanto, se queremos chegar ao fulcro da questão, torna-se necessário estudar o fenômeno primordialmente em sua arena natural.



Objetivos
1) Descrever o padrão de uso do crack e os fatores pessoais associados através de dados obtidos por pesquisa etnográfica.
2) Determinar os fatores preponderantes na maior ou menor autorregulação do uso de crack (tais como: disponibilidade da droga, estrutura de vida, rituais e regras). E sua mudança a partir da introdução do De Braços Abertos.
3) Descrever os significados associados às práticas cotidianas vinculadas, ou não, com o consumo de crack.
4) Descrever os papéis sociais existentes na cena e criar tipologias capazes de codifica-los.



Metodologia
Pretendeu-se observar cuidadosamente, através de uma pesquisa etnográfica, indivíduos em seu dia a dia, registrando quando fazem, o que fazem, onde, com quem, e porque, evitando as cegueiras das noções pré-concebidas. Para tanto, em nossa pesquisa sobre usuários de crack adentramos na comunidade sob estudo, muito similarmente ao antropólogo cultural clássico que estuda uma sociedade tradicional (Grund, 1993). Nossa análise resultante se fundamentou-se no estudo da experiência e percepção dos sujeitos sobre seu contexto, buscando apreender, por meio da imersão no grupo, modos de vida e padrões de significado. Descrever estes ambientes e as atividades que neles se desenrolam, assim como as pessoas e os significados por elas atribuídos a tais atividades (Patton, 1980). Compreender processos, inter-relações pessoais e possíveis padrões desenvolvidos nos contextos sociais (Jorgensen, 1989). Finalmente, identificar problemas e gerar hipóteses para futuros estudos (Grinell, 1997).


Discussão e Resultados
Com apoio estatal criou-se um negócio lucrativo e sem riscos, no qual o poder público envia atualmente milhares de usuários para serem ‘tratados’ e engordarem os bolsos dos donos de clínicas, um verdadeiro complexo industrial do abuso de drogas. Isto não seria possível sem certas crenças criadas desde o início da chamada “Guerra às Drogas”. A primeira delas é a de que, com menos usuários nas ruas teremos uma menor quantidade de uso abusivo. No caso do crack, isto se dá de modo mais dramático por se desconsiderar a possibilidade de qualquer uso não abusivo da substância. Portanto, fica mais forte a ideia de que se punindo os usuários e reduzindo-se pela repressão a disponibilidade da droga combate-se uma suposta epidemia. Não se acredita, ou melhor, se desconhecem os controles sociais informais que poderiam ser fomentados e se considera que todos que usam crack são necessariamente abusadores. Porém, iniciativas como o De Braços Abertos nos mostram como controles sociais formais razoáveis podem interagir perfeitamente com rituais e sanções responsáveis por estabelecer controles sociais informais.


Conclusões/Considerações Finais
Além de apontar a existência de controles informais sobre o uso do crack a pesquisa procurou observar o que ocorria de fato nas cenas de uso, sem preocupar-se em fazer um discurso antidrogas, ou em desencorajar seu uso. Se partíssemos do pressuposto do uso de substâncias tornadas ilícitas ser um mal absoluto a ser combatido de todas as maneiras, teríamos feito um estudo mais dedutivo que indutivo. Nada foi elaborado sem ter saído da interlocução no campo. Distorcer os fatos observados e elaborados a partir do campo, em nome do apoio ao discurso de condenação ao uso de drogas ilícitas, nos colocaria sob o risco de ficarmos desmoralizados frente aos usuários e potenciais usuários quando percebessem nossa falsificação. Certamente, o consumo do crack pode trazer danos terríveis, mas em certos contextos, seu uso pode ser diminuído e mesmo administrado de modo mais controlado e até ser uma maneira de se buscar uma certa vida comunitária.


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